quarta-feira, 26 de maio de 2004

um beijo para ti guardei
nums caixa de metal nua e vazia.
escondida em parte incerta a deixei
para a data em que voltasses, o tal dia.

de tanto querer esquecer o local certo
um dia, quando mal me apercebi,
não me lembrava do sitio que vi
onde escondi o beijo e o peito aberto!

fechei os olhos por um instante
puxando pelas memorias que não quero...
uma ceifeira vejo bem distante
cantando, canta ao longe em forte berro.

caminho para ela procurando
o tal esconderijo que procuro.

"ceifeira inconsciente e feliz,
amiga grande és dum grande amigo!
pedia pelos santos se me dizes
se viste caixa estranha entre o trigo."

"vivo inconsciente e feliz,
antes assim que viva e a dormir.
no dormindo se sonha o que se quis,
fecha-se os olhos ao que esta por vir!

vi uma caixa velha e enferrujada
algures neste campo en que estamos.
se tinha coisa alguma entre os tampos,
era por certo coisa mal-amada..."

"fica sabendo que há parte de mim
dentro dessa tal caixa de que falas.
por querer o que lá guardo foi que vim!
não me acuses dessa forma que me calas...

guardo nessa caixa um simples beijo,
pois a uma jovem (linda!) prometi
guardar até a ver o meu desejo...

só para saber se está bem guardado
pela caixa te tenho perguntado!

sabe ceifeira alegre,
cantadeira,
que deixo o beijo e a caixa
(e o desejo!)
à tua guarda.

se um dia precisar de a ter de volta
confio que me a deixes mesmo à porta."

sem mais me demorar me despedi.
creio na ceifeira porque a vi.

acordo agora em sobressalto!

suado tenho o corpo e o olhar!

olho a porta mal fechada...

esta apenas encostada.

no chão em que me ergo está a caixa
suja, enferrujada e mal-tratada,
completamente destapada...

XanaeR in "os dias do desassossego - volume II", porto, 2004

Sem comentários: